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Na farra das escalas do Samu, sobrou para o denunciante

Sindicância recomenda punição a enfermeiro que revelou o descumprimento de horários na escala dos médicos da central de regulação do serviço

Por Huberto Trezzi – GZH


Série de reportagens do GDI mostrou como descumprimento de escalas prejudicava atendimentos de urgência.

A farra das escalas descumpridas no Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), mostrada pelo colega do Grupo de Investigação da RBS (GDI) Giovani Grizotti, já tem culpados apontados em sindicância interna do governo do Estado. Os responsáveis, segundo a investigação administrativa, são os diretores da regulação estadual da Secretaria Estadual da Saúde (SES-RS), os coordenadores da central de atendimento do Samu, dois médicos reguladores e — pasme! — o enfermeiro que repassou as informações do caso.

Foi o enfermeiro Cleiton Félix, do Samu, que repassou ao GDI as informações que deram início à série de reportagens. Ele comprovou o envio de uma escala falsa ao Ministério da Saúde, com médicos que não atuavam no serviço de urgência, cadastrados como se o fizessem. E também o uso de meios ilegais para permanecer logado no sistema, além da ausência de médicos reguladores na mesa, comprovada em filmagens feitas pelos colegas Marcos Pacheco e  Glaucius Oliveira, da RBS TV.

Alguns médicos confirmaram que, via de regra, atuavam numa escala de sobreaviso informal, desde casa. Com uma escala fictícia, formal, como se estivessem no local de trabalho. O problema, como mostrou o GDI, é que isso trazia demora na verificação do grau de urgência dos pacientes.

O espantoso nisso tudo é a sindicância responsabilizar também a pessoa que revelou o esquema. Conforme a auditoria do governo do Estado, Cleiton não teria chamado uma médica de volta para a mesa reguladora, durante a ausência dela no serviço. Ele alega que não era obrigação sua, o que é corroborado por outras testemunhas.

A sindicância também que Cleiton “teria acessado o sistema e ingressado no DRE, sem ser convidado, sem aparente motivo, após sua exoneração”. Ora, ele fez isso justamente para comprovar que os médicos batiam ponto e deixavam o serviço muito antes de concluir sua carga horária.

A auditoria ainda alega que o enfermeiro não buscou formas oficiais de denunciar a situação. “Não buscou novamente suas chefias, a ouvidoria, a direção da Secretaria de Saúde”, diz trecho do relatório da sindicância. O GDI mostrou que Cleiton escreveu e-mails a chefia sobre o caso e chegou a procurar o gabinete do vice-governador, Gabriel Souza (MDB), para tentar uma comunicação. Na época das reportagens que mostraram o problema no Samu, o próprio governador Eduardo Leite (PSDB) reclamou que o enfermeiro não procurara os canais competentes.

Será mesmo que precisa papel timbrado e carimbado para alguém investigar? Não basta o esforço feito por Cleiton, que chegou a escrever e-mails em seu próprio nome? Mesmo que ele tenha calado durante algum tempo sobre as ilegalidades, um dia decidiu falar. Só que agora querem puni-lo. Desse jeito fica difícil alguém se animar a fazer denúncia. Se o peso da responsabilidade recai tanto para os infratores como para quem denuncia, que tipo de justiça está se fazendo? É preciso saber se o governador concorda com o resultado dessa sindicância, que estabeleceu pesos similares para quem cometeu a irregularidade e quem a revelou.

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