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Especialistas discordam quanto a possíveis benefícios da mudança

Profissionais das áreas de Direito e Psicologia, que acompanham de perto os dramas e os conflitos dos casais com filhos que enfrentam um processo de separação, divergem na avaliação do projeto de lei que tramita no Congresso prevendo tornar regra a guarda compartilhada. Atualmente, a possibilidade acaba sendo a opção apenas quando há um bom nível de entendimento entre as partes. Em debate, a mudança na legislação prevê a concessão da guarda compartilhada mesmo quando houver litígio – e é exatamente aí que apoiadores e críticos assumem lados opostos na discussão. Outorgar a guarda compartilhada é uma iniciativa capaz de cessar as discordâncias dos antigos companheiros em prol do bem-estar dos filhos? Ou o caráter obrigatório da medida, ao contrário, pode inclusive intensificar os atritos e prejudicar o convívio e a troca entre todos?

– O projeto é bem-vindo. Quando acaba o casamento, o que está acabando não é a família, é o casamento. Não precisa modificar a relação com os filhos. A guarda compartilhada quebra uma estrutura de poder, é sempre uma disputa: “O filho vai ficar comigo”, “não, comigo”. Pronto, vai ficar com os dois. Vai acabar essa queda de braço – afirma Rodrigo da Cunha Pereira, presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM).

Defensor da igualdade parental, o presidente da Associação de Pais e Mães Separados (Apase), Analdino Rodrigues Paulino Neto, é pai de uma menina de 16 anos, e pratica há oito a guarda compartilhada, dividindo-se entre as cidades de São Paulo, onde trabalha, e Goiânia, onde vive a filha. A adolescente passa uma semana por mês com o pai, quando ele está em Goiás. O Judiciário, destaca Analdino diante dos que resistem à mudança, está sempre monitorando o correto emprego da lei.

– O litígio dos pais causa um sério problema de desequilíbrio para a criança. O objetivo da guarda compartilhada é dividir o poder do pai e da mãe, e a convivência com a criança ser mais ou menos igual. Se um dos genitores está descumprindo a lei, recebe advertência – explica Analdino.

Professora de direito de família na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Ana Luiza Carvalho Ferreira vê com ressalvas a perspectiva de obrigatoriedade. A guarda compartilhada, acredita, deve estar assentada sobre um mínimo de compreensão.

– Se o casal está num litígio horroroso e o juiz decretar isso de cima para baixo, pode ir contra o menor. Acho temeroso, vejo as mães muito temerosas. A guarda tem de atender aos interesses do menor – salienta Ana Luiza.

Apesar de representar, em tese, a melhor opção para a criança, a guarda compartilhada, segundo a psicóloga Vivian Lago, não é aplicável a todas as situações. Nos casos em que o fim do relacionamento foi motivado por um forte abalo emocional, como a descoberta de uma traição, por exemplo, a professora da Unisinos pensa que o trauma pode comprometer a efetiva e equânime divisão de tarefas.

– Sou contra a imposição. Um dos critérios para que a guarda compartilhada dê certo é o consenso. Os dois têm de estar disponíveis. No meio do fogo cruzado, a criança talvez fique mais desnorteada, sem uma referência mais concreta – adverte Vivian.
 

 

 

 

 

 

 

 

POR DENTRO DA LEGISLAÇÃO
COMO É HOJE
-Guarda unilateral: é exercida pelo pai ou pela mãe, por consenso obtido entre ambos ou a partir de uma decisão do juiz quando não há acordo entre as partes. O filho mora com a mãe, por exemplo, e é organizado um esquema de visitas para que ele passe tempo com o pai, com datas festivas e finais de semana alternados. O detentor da guarda assume a condução da rotina do filho e toma as decisões referentes a escola, atividades extraclasse, cuidados com a saúde etc.
-Guarda compartilhada: a responsabilidade pelos direitos e deveres do filho é conjunta. Pode ser acordada entre os dois ou decretada pelo juiz. A criança ou o adolescente costuma ter estruturas semelhantes em duas casas – um quarto na casa do pai e outro na casa da mãe. De acordo com a situação, definem-se as bases da convivência: o filho passa finais de semana alternados com os pais e, durante a semana, divide-se entre as duas residências.
O QUE PODE MUDAR
– Em tramitação no Congresso Nacional, o Projeto de Lei da Câmara (PLC) 117/2013 prevê que a guarda compartilhada vire regra quando uma união estável ou um casamento termina. Se entrar em vigor, a responsabilidade pela criação dos filhos será dividida entre o pai e a mãe, mesmo que haja litígio, mas desde que ambos estejam aptos e demonstrem o desejo de assumir a tarefa.
– O Superior Tribunal de Justiça já sinalizou receptividade à mudança, concedendo a guarda compartilhada em casos de divergências do ex-casal. Hoje, é comum os juízes optarem pela guarda unilateral quando não há consenso. Se ocorrer a mudança proposta pelo projeto, a guarda compartilhada surgirá sempre como primeira opção.
-Há condições que podem continuar representando impedimento para a guarda conjunta, como um quadro de saúde grave, uma dependência química ou a falta de convívio por longo período (o homem que só reconheceu a paternidade de um filho na adolescência). Também haverá a possibilidade de a guarda ser deferida a terceiros.
-A mudança valerá para casos ocorridos a partir da aprovação da medida, não alterando acertos anteriores. Os interessados poderão entrar na Justiça novamente.
– O PLC 117/2013 passou pela Câmara dos Deputados e está atualmente aguardando votação na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado. Se aprovado, o próximo passo é a sanção ou o veto presidencial.
PENSÃO ALIMENTÍCIA
Em quaisquer das modalidades de guarda, está previsto o pagamento de pensão alimentícia – a quantia é destinada não apenas ao custeio da alimentação, mas também a outras despesas, visando à manutenção do padrão de vida dos filhos. Na guarda unilateral ou na compartilhada, pode haver o repasse de dinheiro de forma indireta, e não apenas em espécie: o responsável pelo pagamento da pensão assume a mensalidade escolar ou a do plano de saúde, por exemplo. Mesmo na guarda compartilhada, em que estão previstas decisões conjuntas e divisão de responsabilidades, um dos genitores será o responsável financeiro, recebendo, do ex-companheiro, uma quantia para complementar o orçamento referente à criança. A eventual aprovação do PLC 117/2013 não deve alterar as práticas em vigor.
Fontes: Aline Kopplin, advogada, Analdino Rodrigues Paulino Neto, presidente da Associação de Pais e Mães Separados (Apase), Ana Luiza Carvalho Ferreira, advogada e professora da PUCRS, Conrado Paulino da Rosa, advogado e presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) – Seção RS, e Rodrigo da Cunha Pereira, advogado e presidente do IBDFAM
NA HORA DA SEPARAÇÃO
CUIDADOS PARA PRESERVAR A RELAÇÃO ENTRE PAIS E FILHOS
-Deixe claro que o que está terminando é o casamento. O rompimento se dará entre o casal que vivia até então como marido e mulher, e não entre pais e filhos. As crianças devem entender que a convivência vai mudar, mas serão mantidos os laços afetivos.
-Em benefício da saúde emocional, é vital que o filho continue tendo contato com o pai e a mãe. Mesmo não morando na mesma casa, ter a referência das figuras materna e paterna é muito importante.
-Ao deixar de viver na mesma residência, ou quando o tempo de convivência é muito reduzido, o pai e a mãe devem se esforçar para permanecer presentes no cotidiano dos filhos, buscando no colégio, assistindo ao campeonato de futebol e propondo passeios. A distância física pode ser amenizada com telefonemas e troca de mensagens. Mantendo um padrão de convivência próximo ao que tinha, a criança entende que a separação ocorreu entre o casal, e não entre ela e os pais.
-Discussões de ordem prática sobre a vida conjunta que está sendo desfeita costumam pontuar a separação. Evite ao máximo debater questões referentes a patrimônio, pensão e dívidas na frente das crianças.
-Por mais significativas que sejam as desavenças com seu (sua) ex-
ccompanheiro (a), não tente jogar a criança contra ele (a).
-O fim do casamento representa um grande impacto na vida dos filhos. Procure não promover outras mudanças nesse período, como a troca de casa e de escola e o consequente distanciamento de pessoas importantes, como colegas, professores e vizinhos. Na medida do possível, mantenha a rotina inalterada.
-É comum surgirem alterações no comportamento infantil nesse período. Fique atento (a) a fatores como falta ou excesso de sono e apetite, aumento da agressividade, tendência ao isolamento e queda no desempenho escolar.
Fonte: Vivian Lago, psicóloga e professora

da Unisinos.

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