O Brasil é, sim, um experimento sociológico inédito. Um experimento que, às vezes, dá a impressão de que vai explodir
Por Gabriel Sant’Ana Wainer
Congresso aprovou nesta quarta-feira (25) projeto que aumenta número de deputados para 531.Bruno Spada / Câmara dos Deputados
Nós vivemos uma semana que nos obriga a admitir, com certo constrangimento, que talvez sejamos mesmo um povo inédito no planeta. Um povo que não cansa de produzir experimentos sociopolíticos que fariam corar até o mais alucinado cientista social ou antropólogo. Somos uma nação que, diante de uma fila de 2,6 milhões de pedidos de aposentadoria e auxílio, provocada deliberadamente pelo governo para não estourar o teto de gastos, não apenas aceita o absurdo como ainda se entretém com maquiadores de deputada.
O aniversário de 35 anos do INSS serviu apenas para nos lembrar do que ele se tornou: um sistema em ruínas, tomado por fraudes, atravessadores e entidades que operam ilegalmente sobre aposentadorias. E, como se não bastasse, com um governo que, para não admitir o rombo, travou por meses novas concessões. Estelionato silencioso contra o tempo e a paciência dos brasileiros.
Na mesma sessão, os deputados derrubaram o decreto do presidente Lula que aumentava o IOF. Uma boa notícia, mas que passou quase despercebida. O governo se esforçou tanto para vender a ideia de que o IOF é imposto de rico e que a medida não afetaria o povo, que pouca gente de verdade percebeu a derrota. Mas foi. A medida era parte central da estratégia fiscal do governo e expôs o isolamento de Fernando Haddad, que apanhou quase calado.
Enquanto isso, o país parava para discutir se uma deputada poderia ter maquiadores pagos com verba pública. Érika Hilton tentou justificar dizendo que eles também atuam como assessores. Ninguém sabe exatamente como. Mas o que poderia ser um debate profícuo sobre o uso indevido de verba virou uma rinha identitária: quem critica Érika é transfóbico? Quem defende, é conivente?
Faltam prioridades. Falta foco. Falta vergonha na cara.
Vivemos num país onde se discute se a culpa por uma deputada contratar maquiadores é da transfobia. Onde se diz que imposto é progressivo mesmo quando atinge o cheque especial do trabalhador. Onde se prefere mais deputados a mexer nos privilégios de qualquer um que já esteja lá. Onde se condena o INSS por atender rápido demais.
O Brasil é, sim, um experimento sociológico inédito. Um experimento que, às vezes, dá a impressão de que vai explodir.
Mas segue.
Segue em frente, como se nada fosse.
Como se tudo isso fosse normal.