Pesquisar
Close this search box.

Projeto de lei que tramita na Câmara proíbe venda de produtos orgânicos em supermercados? Não é verdade!

Informação tem tomado as redes sociais nos últimos dias. Não há proibição de venda, mas restrição pode ocorrer.

Por Gisele Barros e Marlen Couto, O Globo

 

A informação de que uma proposta legislativa aprovada nesta semana na Comissão de Agricultura da Câmara pretende proibir a venda de produtos orgânicos em supermercados tomou as redes sociais nos últimos dias. O assunto ganhou repercussão poucos dias após uma comissão especial da Casa aprovar um projeto de lei que flexibiliza a regulação de agrotóxicos no país.

A possível mudança na lei sobre a venda de orgânicos mobilizou produtores e consumidores, já que as redes varejistas são um importante local de comercialização desses produtos. Uma pesquisa do Conselho Brasileiro da Produção Orgânica e Sustentável (Organis) feita em 2017 aponta que, para 64% dos consumidores de nove capitais pesquisadas, os supermercados são o principal espaço de compra de orgânicos.

Mas a venda de produtos orgânicos em supermercados será proibida? Não é verdade.

Projeto não proíbe a venda de produtos orgânicos em supermercados (Foto: G1)Projeto não proíbe a venda de produtos orgânicos em supermercados (Foto: G1)

Projeto não proíbe a venda de produtos orgânicos em supermercados (Foto: G1)

Ao contrário do que foi noticiado, o PL 4576, de 2016, não dispõe sobre a comercialização de produtos orgânicos em supermercados, mas especificamente sobre a venda direta a consumidores realizada, exclusivamente, por agricultores familiares. Além disso, a proposta não foi aprovada nesta semana. A Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados deu seguimento ao texto no dia 13 de junho. A tramitação prevê que ele ainda seja analisado pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) antes de ser encaminhado ao plenário.

A Lei da Agricultura Orgânica, sancionada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em dezembro de 2003, define no primeiro parágrafo do artigo 3 que a certificação para o agricultor familiar é facultativa, desde que ele seja previamente cadastrado junto a um órgão fiscalizador, assegure a rastreabilidade do produto e o livre acesso a consumidores e fiscais aos locais de produção e processamento. O que a nova lei pretende é determinar que, antes de realizar a comercialização direta, ou seja, em feiras livres e propriedades privadas, os agricultores familiares sejam cadastrados em um órgão da Administração Pública Federal, responsável pela regulamentação da produção agrícola.

O relator do projeto, deputado Luiz Nishimori (PR-PR), argumenta que houve interpretação equivocada do texto aprovado na comissão. Segundo ele, o objetivo da proposta é punir produtores que vendem alimentos comuns como se fossem orgânicos, e não proibir a venda em algum estabelecimento comercial. Nishimori também foi relator do projeto que flexibilizou o uso de agrotóxicos.

“O texto foi totalmente distorcido. A ideia do projeto é justamente defender os produtores orgânicos, não o contrário. Queremos punir aqueles que vendem ‘gato por lebre’. A proposta se refere a uma relação direta entre agricultor familiar e consumidor, e em nada modifica a venda em supermercados”, diz.

Questionado se as várias interpretações sobre o PL podem resultar em uma nova redação do texto, Nishimori defende a manutenção da proposta. “O projeto foi aprovado por unanimidade. Toda a comissão teve tempo para apresentar mudanças no texto, mas avaliamos que ele estava claro. Não acho que seja o caso de mudar nada, mas o projeto ainda vai passar por outras comissões, e terá um outro relator que vai ter liberdade para mudá-lo.”

Várias pessoas compartilharam textos com a informação equivocada (Foto: Reprodução/Facebook)Várias pessoas compartilharam textos com a informação equivocada (Foto: Reprodução/Facebook)

Várias pessoas compartilharam textos com a informação equivocada (Foto: Reprodução/Facebook)

Atualmente, segundo a Regularização da Produção Orgânica do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), os produtores podem se regularizar de duas formas. A primeira é obter certificação por um Organismo da Avaliação da Conformidade Orgânica (OAC) credenciado junto ao MAPA. A segunda é organizar-se em grupo e realizar um cadastro junto ao Ministério para a venda direta, sem certificação. A diferença entre as duas é que, quando o produtor tem o cadastro para venda direta sem certificação, não pode vender para terceiros, apenas diretamente ao consumidor e para as compras do governo. Já quando o produto é certificado, pode ser vendido em feiras, supermercados, lojas, restaurantes, hotéis, indústrias, e até pela internet.

As regras do MAPA definem ainda que, enquanto os produtos vendidos em supermercados devem estampar o selo federal do Sistema Brasileiro de Avaliação de Conformidade Orgânica (SisOrg), para vender em uma feira, o produtor sem certificação apresenta um documento chamado Declaração de Cadastro, o que demonstra que ele está cadastrado junto ao MAPA e que faz parte de um grupo que se responsabiliza por ele.

Restrição na comercialização

O texto afirma que a comercialização direta de produtos orgânicos aos consumidores se realizará “exclusivamente por agricultores familiares”, em propriedade particular ou em feiras livres ou permanentes, instaladas em espaços públicos. O Ministério da Agricultura é contra o projeto e recomenda em uma nota técnica a não continuidade da proposta por entender que, além de não contribuir com a cadeia produtiva de orgânicos, a PL irá prejudicar o desenvolvimento da atividade. Para a equipe técnica da Coordenação de Agroecologia e Produção Orgânica do Ministério, o texto limita a comercialização de pequenos agricultores, feirantes e outros produtores que não têm reconhecimento como agricultores familiares.

Além disso, o órgão destaca que fiscalizações realizadas por auditores da pasta mostram que as fraudes, citadas como justificativa para a nova lei, também são cometidas por agricultores familiares ligados a organizações de controle social.

O Conselho Brasileiro da Produção Orgânica e Sustentável (Organis) divulgou um posicionamento em que afirma que há falhas na redação do projeto. Segundo a entidade, o texto exclui produtores e empreendedores do setor de orgânicos que não sejam produtores familiares, impedindo a comercialização direta por estes segmentos do mercado mesmo que tenham certificação.

Para Rogério Dias, vice-presidente da Associação Brasileira de Agroecologia para a região Centro-Oeste e conselheiro técnico da Organis, o texto não acrescenta segurança ao consumidor. O projeto estabelece que a comercialização como orgânico de produto que não o seja configura crime contra as relações de consumo e fica sujeito às penas previstas no Código de Defesa do Consumidor. Dias, porém, diz que o setor de orgânicos já está sujeito ao código por meio da atuação do Ministério Público.

“O projeto alterou o texto da Lei da Agricultura Orgânica dizendo que a comercialização direta se realizará exclusivamente por agricultores familiares. Pegou o que era exceção e colocou como se fosse a única possibilidade. Se você não é agricultor familiar não pode fazer venda direta. É inconstitucional. Não se pode fazer restrição. Também traz implicações aos produtores familiares. As vendas aos governos por muitos desses produtores, para merenda escolar por exemplo, também não poderiam ser feitas”, afirma.

‘É ou não é?’, seção de fact-checking (checagem de fatos) do G1, tem como objetivo conferir os discursos de políticos e outras personalidades públicas e atestar a veracidade de notícias e informações espalhadas pelas redes sociais e pela web. Sugestões podem ser enviadas pelo VC no G1, pelo Fale Conosco ou pelo Whatsapp/Viber, no telefone (11) 94200-4444, com a hashtag #eounaoe.

Categorias

Categorias

Arquivos

Arquivos